A proposta de regulação das redes sociais no Brasil tem gerado um dos debates mais sensíveis e necessários da atualidade. A intenção declarada é combater a desinformação, os discursos de ódio e proteger a democracia. Mas a linha entre o que se considera regulação e o que pode se configurar como censura é tênue e extremamente perigosa.
Nesta quarta-feira, o Supremo Tribunal Federal, sob a presidência do ministro Luís Roberto Barroso, retomará o julgamento que pode estabelecer como as plataformas digitais serão responsabilizadas por conteúdos postados por usuários. O ministro afirma que o STF não está legislando, mas apenas cumprindo seu papel diante da omissão do Congresso Nacional, que, segundo ele, não aprovou uma legislação específica. No entanto, essa justificativa levanta sérias preocupações sobre a separação dos poderes e o risco de extrapolação de competências.
O mais inquietante é perceber que esse movimento regulatório tem ecos de regimes autoritários. O próprio presidente Lula, recentemente em visita à China, país notoriamente conhecido por sua censura sistemática nas redes, chegou a discutir com o presidente Xi Jinping modelos de regulação digital. Isso, por si só, já acende o sinal de alerta: estaríamos importando práticas autoritárias para um país que se diz democrático?
A alegação de que se quer “proteger” a sociedade pode esconder um objetivo mais nocivo: silenciar vozes dissonantes. A liberdade de expressão corre sério risco quando se começa a punir cidadãos por críticas a autoridades. O que antes era visto como um exercício legítimo de opinião, pode passar a ser classificado como “agressão” ou “discurso de ódio”, de acordo com interpretações subjetivas e convenientes ao poder.
O cerceamento da liberdade de fala sob o pretexto de moderação é o primeiro passo para um controle ainda maior. Os que hoje defendem a regulação por motivos ideológicos podem, amanhã, tornar-se as vítimas de um sistema que criminaliza opiniões divergentes. A história nos ensina que regimes autoritários não se constroem do dia para a noite. Começam assim: com o controle da palavra.
O Congresso Nacional, que deveria ser a casa do povo, tem sido omisso. Agora tenta correr atrás do prejuízo, prometendo tomar a frente do debate. Mas o tempo perdido favoreceu o avanço de decisões monocráticas e julgamentos com profundos impactos sociais, tomados por uma instância que, por mais respeitável que seja, não foi eleita para legislar.
Regulação, sim, é necessária para proteger crianças, evitar crimes, coibir abusos. Mas ela precisa ser clara, transparente e, acima de tudo, respeitar os fundamentos da democracia. Liberdade de expressão não é um privilégio, é um direito constitucional.
Precisamos de vigilância, de debate amplo e plural, e de leis que reflitam a vontade do povo, não de decisões impostas de cima para baixo. O Brasil não pode flertar com a censura. Porque quem cala hoje os outros, corre o risco de não poder falar amanhã.
Waldiney Passos