Já passa de mil o número de mortos em três dias de conflito na Síria

O conflito entre forças de segurança sírias e rebeldes leais ao ex-ditador Bashar-al-Assad já deixou mais de mil mortos em apenas três dias. Trata-se de um dos maiores massacres na Síria desde 2011. A maioria das vítimas, cerca de 750 pessoas, é civil da minoria alauíta, a qual pertence Assad.

Há muitas mulheres e crianças entre os executados por forças do governo interino sírio e grupos aliados em três dias de confrontos contra militantes leais a Assad, deposto em dezembro, informou o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH). O número de combatentes mortos chegaria a 125 entre as forças do governo e 148 entre os rebeldes leais a Assad. Porém, segundo o OSDH os números são incertos e, provavelmente, maiores.

Autoridades do governo afirmaram no sábado que “restabeleceram a ordem” no noroeste do país, antigo reduto de Assad, que governou o país com mão de ferro por 24 anos. O presidente sírio, Ahmed al-Sharaa, pediu neste domingo “unidade nacional”, após três dias de confrontos sem precedentes desde a queda de Assad.

O conflito começou com um ataque, na quinta-feira, de apoiadores de Assad às forças de segurança na cidade de Jablé, na província de Latakia, no oeste da Síria. Esta região é o berço da comunidade muçulmana alauíta, da qual o clã Al-Assad se origina.

Baseada em Londres, o OSDH tem uma ampla rede de informantes no terreno e afirmou que esses civis foram “executados” por “motivos confessionais” por agentes de segurança e combatentes pró-governo e que também houve “saques de casas e propriedades”. Pela manhã, a agência de notícias estatal Sana informou que as forças de segurança repeliram um “ataque de remanescentes do regime deposto” contra o hospital nacional na cidade costeira de Latakia.

Uma fonte do Ministério da Defesa disse posteriormente à agência que as forças bloquearam as estradas que levam à área costeira ocidental para evitar “violações”, sem especificar quem as estava cometendo. A Sana também informou que forças de segurança foram enviadas para Latakia, Jableh e Baniyas, mais ao sul, para restaurar a ordem.

Os incidentes, os primeiros dessa magnitude desde a derrubada do regime de Assad em dezembro, começaram após um ataque sangrento de simpatizantes do ex-líder contra as forças de segurança na cidade costeira de Jableh, segundo as autoridades. No dia seguinte, as forças de segurança lançaram operações de busca na região de Latakia, bastião da minoria alauita — que representa 9% da população do país — um ramo do islamismo xiita ao qual pertencem Assad e sua família.

A segurança é um dos grandes desafios do novo governo sírio, de base islamista, instalado em dezembro após uma rebelião que derrubou Assad em 11 dias. Em um discurso na sexta-feira, o presidente interino da Síria, Ahmed al-Sharaa, pediu aos insurgentes que “deponham as armas e se rendam antes que seja tarde demais”. Por sua vez, o diretor de segurança da província de Latakia, Mustafa Kneifati, pediu aos civis neste sábado que não “se deixem levar por incitações”, segundo declarações à Sana.

O OSDH e outras fontes publicaram vídeos na sexta-feira mostrando dezenas de corpos empilhados no pátio de uma casa, com várias mulheres chorando nas proximidades. O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) pediu no sábado por acesso “seguro” para profissionais médicos e de resgate no oeste da Síria.

Potências ocidentais e vizinhos da Síria enfatizaram a necessidade de unidade na nova Síria, que busca financiamento para reconstruir um país devastado por anos de guerra civil sob Assad. A França “condenou” no sábado “nos termos mais enérgicos as atrocidades cometidas contra civis por motivos confessionais e contra prisioneiros” na Síria.

Agência O Globo

ONU cita “esperança cautelosa” após queda de Assad na Síria

O enviado das Organização das Nações Unidas (ONU) para a Síria, Geir Pedersen, disse neste domingo (8) que o novo momento político do país, com a queda do presidente Bashar al-Assad, marca o fim de “um capítulo sombrio” e abre caminho para “uma esperança cautelosa por um novo tempo de paz, reconciliação, dignidade e inclusão para todos os sírios”.

Pederson avaliou o momento como decisivo na história da Síria, que “suportou quase 14 anos de sofrimento implacável e perdas indescritíveis”. Ele destacou que o momento “renova o sonho de voltar para casa, para as famílias separadas pela guerra, renova a esperança dos reencontros e, para os injustamente detidos, renova a busca por justiça”.

Transição inclusiva
O enviado da ONU para o país do Oriente Médio pediu ainda que todas as partes envolvidas no novo momento político do país evitem o derramamento de sangue e iniciem uma transição que inclua todas as comunidades, com foco na paz e na estabilidade e em evitar que o país seja dividido.

Segundo Pederson, existe um “desejo claro”, manifestado por milhões de sírios, de que sejam implementados acordos de transição estáveis e inclusivos e que as instituições sírias continuem a funcionar.

“Nesse sentido, o representante da ONU fez um apelo para que todos os atores armados mantenham a boa conduta, a lei e a ordem, protejam os civis e preservem as instituições públicas.”

Desafios
Para Pedersen, o fato de o principal grupo de oposição, o Hay’at Tahrir Al-Sham (HTS), ser listado como grupo terrorista traz desafios. O importante agora, segundo ele, é que sejam dados passos para uma transição rumo a um “futuro democrático”.

O enviado especial disse ainda que acompanha as movimentações de grupos armados e que alguns procedimentos teriam de ser seguidos caso o HTS venha a ser retirado da lista de terrorismo.

Após participar de uma reunião de alto nível em Doha neste fim de semana, incluindo encontros com Irã, Turquia e Rússia, Pederson disse ter reforçado a necessidade de garantir acordos de transição que incluam todas as comunidades na Síria. Segundo ele, todos os interlocutores convergem nesse aspecto e manifestaram apoio ao papel das Nações Unidas nesse processo.

Itamaraty
O Ministério das Relações Exteriores do Brasil emitiu nota, na tarde deste sábado (7), informando que acompanha a escalada de violência na Síria e instando brasileiros que moram no país a procurar a embaixada brasileira em Damasco, para que também saiam do país.

No comunicado, o Itamaraty disponibilizou um telefone de emergência e recomendou que brasileiros consultem o portal consular, com alertas e atualizações sobre a situação no país do Oriente Médio.

“Em caso de emergência, o telefone de plantão da Embaixada em Damasco é: +963 933 213 438. O plantão consular do Itamaraty também permanece disponível no número +55 61 98260-0610 (inclusive WhatsApp).”

Entenda
Rebeldes sírios declararam ter deposto o presidente Bashar al-Assad após assumirem o controle de Damasco neste domingo, forçando-o a fugir e pondo fim a décadas de um governo classificado como autocrático da família de Assad após mais de 13 anos de guerra civil.

Vídeos publicados na agência de notícias RTP mostram grupos invadindo o palácio presidencial sírio, onde Bashar al-Assad residia. As imagens mostram o local tomado por rebeldes segurando bandeiras do país e parcialmente destruído. Há ainda relatos de focos de incêndio na residência oficial.

Agência Brasil