Por 8 votos a 3, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (26) que as plataformas digitais poderão ser responsabilizadas diretamente por conteúdos ilegais publicados por seus usuários, mesmo sem ordem judicial prévia. A decisão derruba a proteção prevista no Artigo 19 do Marco Civil da Internet, em vigor desde 2014.
A norma previa que provedores só poderiam ser responsabilizados caso se recusassem a retirar conteúdos após decisão judicial. Com a nova interpretação do STF, a regra foi considerada inconstitucional, por não proteger adequadamente os direitos fundamentais e a democracia.
=A Corte entendeu que plataformas como Facebook, X (antigo Twitter), YouTube, entre outras, têm o dever de agir diante de notificações extrajudiciais sobre conteúdos ilegais. A responsabilização poderá ocorrer caso não tomem providências após esses avisos.
Entre os tipos de conteúdo que devem ser removidos após notificação estão:
Atos antidemocráticos
Terrorismo
Indução ao suicídio ou automutilação
Incitação ao preconceito (raça, religião, identidade de gênero, entre outros)
Crimes contra a mulher
Pornografia infantil
Tráfico de pessoas
A maioria dos ministros destacou a transformação tecnológica desde a criação do Marco Civil, apontando que as plataformas ganharam poder desproporcional na circulação de informações e não podem se isentar da responsabilidade pelos danos causados.
Alexandre de Moraes criticou o modelo de negócios “agressivo” das big techs e afirmou que elas não podem operar como “territórios sem lei”. Cármen Lúcia declarou que os algoritmos das redes sociais são opacos e que as plataformas se tornaram “donas das informações”. Gilmar Mendes afirmou que o Artigo 19 se tornou obsoleto e defendeu uma nova regulamentação mais alinhada aos tempos atuais. Cristiano Zanin argumentou que o modelo atual impõe às vítimas o ônus de acionar a Justiça para remover postagens ofensivas.
Os ministros Nunes Marques, André Mendonça e Edson Fachin votaram contra a responsabilização direta. Para eles, a liberdade de expressão deve ser protegida e a mudança na regra deveria ser feita pelo Congresso Nacional, não pelo Judiciário.
Nunes Marques afirmou que responsabilizar diretamente os provedores pode gerar censura e comprometer o debate livre de ideias, considerado essencial para a democracia.
A decisão foi tomada durante o julgamento de dois recursos:
Facebook contestava uma condenação por danos morais por causa de um perfil falso criado na plataforma.
Google buscava isenção de responsabilidade por conteúdos ofensivos hospedados em um site.
Ambos os casos serviram de base para o STF definir uma tese jurídica que passará a orientar decisões em instâncias inferiores até que uma nova lei seja aprovada pelo Congresso.
A decisão passa a valer imediatamente, e as plataformas precisarão revisar suas políticas internas de moderação de conteúdo. Até que o Legislativo aprove uma nova regulamentação específica, valerá a regra do STF, que permite responsabilização civil com base em notificação extrajudicial nos casos listados.
A mudança marca um ponto de inflexão no debate sobre liberdade de expressão e responsabilidade digital no Brasil.