Editorial – O fracasso da alfabetização funcional é um retrato do Brasil que não aprende

O Brasil continua repetindo as mesmas lições e falhando nas mesmas provas. Dados divulgados nesta semana pelo Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf) revelam que 29% da população entre 15 e 64 anos é analfabeta funcional, ou seja, quase um terço do país não consegue interpretar frases simples nem fazer contas básicas. É um índice que permanece estagnado desde 2018, escancarando o fracasso de políticas públicas que deveriam combater esse cenário vergonhoso.

Mais grave ainda é o retrocesso entre os jovens de 15 a 29 anos, cuja taxa de analfabetismo funcional subiu de 14% para 16%. A pandemia certamente agravou o problema, com o fechamento das escolas e a falta de estrutura para o ensino remoto. Mas culpar apenas a Covid-19 seria simplista, o descaso com a educação é muito anterior ao coronavírus.

Este problema é, em parte, consequência da corrupção que drena bilhões de reais da educação pública, desviando recursos que deveriam equipar escolas, treinar professores e oferecer merenda e transporte de qualidade. A cada desvio de verba, um estudante deixa de aprender. A cada propina escondida, um jovem perde a chance de mudar sua história.

Também pesa a falta de continuidade nas políticas públicas, com programas que mudam a cada troca de governo, interrompendo qualquer tentativa de avanço real. Planejamento de longo prazo virou exceção, e a educação continua tratada como moeda de troca política.

E há ainda a ausência da família no processo educativo. A escola não pode fazer tudo sozinha. Quando pais e responsáveis se afastam da vida escolar dos filhos, o impacto é devastador. Educação é uma responsabilidade coletiva, e a omissão dentro de casa também contribui para esse cenário de ignorância funcional.

A pesquisa revela, ainda, desigualdades gritantes: os analfabetos funcionais estão mais presentes entre indígenas (47%), negros (30%) e trabalhadores de baixa renda. Até mesmo pessoas com ensino superior (12%) apresentam essa limitação, revelando que o diploma nem sempre reflete conhecimento real.

O país não sairá do subdesenvolvimento enquanto mais de um quarto da população adulta não conseguir compreender o que lê. Não há crescimento econômico sustentável, cidadania plena ou democracia sólida sem educação básica de qualidade.

Apesar de alguns avanços e esforços isolados, é evidente: o Brasil precisa fazer muito mais, com urgência, seriedade e compromisso, se quiser, um dia, virar essa página.

Waldiney Passos